O Salim saiu, se privatizou. Ao entregar o cargo no Governo e jogar a toalha, Salim Mattar mostrou como é resistente e forte o lobby dos donos das empresas públicas ou as famosas estatais. O empresário de sucesso chegou no governo como “o vendedor de estatais”. Listou empresas desnecessárias e deficitárias, separou as que não servem para nada e indicou que, por ele, todas, absolutamente todas, as estatais seriam vendidas ou simplesmente extintas para conter os gastos públicos desnecessários. Este é um discurso que acompanha o presidente Jair Bolsonaro desde a campanha eleitoral e está perdendo terreno. Gasto é como unha, tem que ser cortado toda semana e a pressão por crescimento é diária.
O “vendedor de estatais” perdeu para um grupo poderoso. Ninguém sabe ao certo, mas, segundo cálculos, são mais de mil estatais. Algumas existem apenas no papel, mas pagam salários, privilégios, fundos de pensão e vantagens que o mundo real desconhece. Existem estatais criadas para acabar com estatais, mas não acabaram com a principal e continuam existindo como penduricalhos. É um filme de suspense de primeira linha. Aqui no Distrito Federal uma estatal foi criada para vender terrenos públicos. A criação de Brasília desapropriou o quadrilátero do DF que está sendo vendido. O incrível é que ano a ano, a soma dos valores obtidos pela venda do patrimônio público não paga o orçamento da própria estatal. Esta é uma que vai ficar inclusive depois que todo o patrimônio for vendido. As empresas públicas não são do público, mas dos funcionários que se encastelam nestas ilhas.
Salim Mattar mostrou que o presidente Jair Bolsonaro assumiu com incríveis 698 empresas do governo. No seu trabalho, conseguiu desinvestir 84 empresas. Vendeu participações, extinguiu e reduziu investimentos. Só este movimento resultou em 150 bilhões de reais em economia. Um valor expressivo, cinco orçamentos anuais do programa bolsa família. O ex-secretário chega a dizer que a manutenção de estatais é inconstitucional já que esta função de mercado, pela Constituição, é privada e o Estado se coloca como responsável por gastos. Jogar dinheiro do povo nas estatais, segundo ele, “corruptas” e feudos políticos, não é e nunca foi função pública. O projeto de vender as estatais esbarrou no poço de interesses e não é só de funcionários, mas também de empresariais e políticos. Em volta de uma entidade assim é montado um esquema forte de fornecimento de serviços, venda de bens e facilidades. O emaranhado é complexo.
A situação chegou ao ponto de que ser presidente da Petrobras é melhor do que ser presidente da República. Ganha muito mais, tem mais poderes imediatos e reina num mundo onde o risco não existe. Salários de R$ 120 mil e vantagens que nenhum trabalhador tem. Aviões intercontinentais à disposição, sem restrição ou controle. Cartões de crédito corporativos sem limites e ainda um certo ar de iniciativa privada. Anda pelo mundo como grande executivo de empresa gigante. A Petrobras é uma das maiores empresas petrolíferas do mundo, montada num monopólio que faz o brasileiro pagar estas excentricidades e ter os combustíveis entre os mais caros do mundo. Isto se reflete no transporte próprio e na formação dos preços dos produtos.
O gesto de saída de Salim Mattar ao invés de dar vitória aos estatizantes, joga luz no problema. O ministro Paulo Guedes entendeu o recado e alerta que é preciso continuar na proposta de “tirar o Estado da cacunda dos brasileiros”. Já está certo de que haverá privatização, mas nunca nos moldes da proposta original de fazer uma desmobilização. Agora que o centrão chegou ao poder, os amantes das estatais se empoderaram. Está mais difícil reduzir o tamanho do estado. Outra baixa significativa e simbólica foi a saída do secretario Paulo Uebel que prometia desburocratizar e fazer o governo digital. A burocracia vence todos, desde Hélio Beltrão que foi nomeado ministro da desburocratização pelo presidente João Figueiredo e o monstro chamado máquina pública cresce e precisa se justificar e faz isso, colocando dificuldades e entraves, ou seja, burocracia.
*José Maria Trindade é repórter e comentarista de política da Jovem Pan.